Intelectual de Abril, militante comunista, antifascista

Diana Ferreira

Prémio Nobel da Literatura - ainda hoje espinha atravessada na garganta de muitos.

A sua obra literária reflecte tão claramente os problemas, os males, os sofrimentos sentidos pelo povo; as injustiças, as desigualdades, as hipocrisias, os oportunismos, os egoísmos (entre outras dimensões próprias de um sistema com uma natureza opressora, agressiva e predadora – o sistema
capitalista), que hoje, dezenas de anos depois de muitos desses livros terem sido escritos, as suas linhas e a realidade que retratam são tremendamente actuais.

Recordo-me de quando li o primeiro livro de Saramago, algures entre os meus 15 e 16 anos – tive a sorte de crescer com livros “sempre à mão”, entre os quais muitos de Saramago. Hesitante entre o Levantado do Chão e a Jangada de Pedra, as palavras da contracapa ajudaram a decidir. Porque “(…) Do chão sabemos que se levantam as searas e as árvores, levantam-se os animais que correm os campos ou voam por cima deles, levantam-se os homens e as suas esperanças. Também do chão pode levantar-se um livro, como uma espiga de trigo ou uma flor brava. Ou uma ave. Ou uma bandeira. (…)”. E nas linhas deste livro encontrei sofrimento, mas também luta, dignidade e coragem. O que me fez seguir lendo muitos outros, ao longo dos anos. E, em diferentes momentos, revisitar as suas palavras, mesmo as mais ácidas.

Também hoje, face ao momento social, político, económico que vivemos (tanto no plano nacional, como no plano internacional), faz sentido regressar a Saramago e a muitas das suas linhas.

Saramago levou longe a literatura, a língua e a cultura portuguesas. A sua obra literária, profundamente ligada às aspirações de progresso da Humanidade, estendeu-se além dos livros e chegou à música, ao teatro, ao cinema. Sim, foi um escritor maior da língua portuguesa. Mas não só.

Saramago escolheu um lado, também na obra que escreveu e publicou. Escolheu o lado dos oprimidos, dos injustiçados, dos explorados, dando-lhes voz e vida em incontáveis milhares de páginas.

Também por isso o celebramos. E continuaremos a celebrar.